Alexandre de Lara, de 28 anos, recebeu dose 10 vezes maior do que a indicada. Médicos explicam que todos os remédios podem gerar efeitos adversos e só devem ser usados após consulta.
Casos de superdosagem são registrados em todos os tipos de medicamentos e podem causar problemas graves e, em casos extremos, permanentes. Médicos consultados pelo g1 explicam que a principal recomendação para evitar danos à saúde – que podem atingir fígado, rins e até coração e cérebro – é evitar a automedicação e seguir as recomendações da bula.
“Não existe medicamento simples. Até os analgésicos de mais fácil acesso podem causar problemas graves. A automedicação não é segura, e todo remédio precisa ser tomado após recomendação médica e na quantidade recomendada”, diz José Luis Toribio, médico intensivista do Grupo Hospital Conceição (GHC).
Em Porto Alegre, a Polícia Civil investiga a suspeita de superdosagem de medicamento oferecido a um paciente de um hospital da cidade. O caso ocorreu em outubro de 2021. Desde então, o jovem Alexandre Moraes de Lara, de 28 anos, está em estado vegetativo e precisa de cuidados 24 horas por dia.
De acordo com a delegada Carla Kuhn, responsável pelo caso, a investigação está na fase de oitivas. “Estamos aguardando as sindicâncias que foram instauradas no Conselho Regional de Medicina do RS (Cremers) e no próprio hospital. Semana que vem serão chamadas para depor a equipe de enfermagem do hospital.” Segundo a delegada, o prazo de conclusão do inquérito policial é de 30 dias.
Alexandre Moraes de Lara, de 28 anos, deu entrada no Hospital Humaniza para tratar um problema cardíaco. No entanto, em vez de receber dois comprimidos de propafenona, o paciente recebeu 20 – ou seja, 10 vezes mais. O remédio, indicado para controlar batimentos do coração, acabou provocando uma parada cardiorrespiratória. Um laudo assinado por um médico contratado pela família afirma que o estado vegetativo de Alexandre tem grande potencial de ser permanente.
Um prontuário assinado pelo diretor-executivo do hospital aponta o erro da equipe. Segundo o documento, “a medicação dispensada pela farmácia do hospital era divergente da dosagem registrada no sistema e da prescrição médica”. O médico indicou 600 miligramas ao paciente, mas o hospital deu 6 mil miligramas.
Eduardo Trindade, médico do Hospital de Clínicas e ex-presidente do Conselho Regional de Medicina (Cremers), afirma que o caso envolvendo Alexandre só pode ser analisado em detalhes por quem teve acesso ao paciente e aos procedimentos realizados. Genericamente, no entanto, o médico explica que remédios indicados para controlar batimentos do coração, se ingeridos em excesso, podem gerar problemas no órgão:
“Não sabemos detalhes sobre esse caso concreto, mas uma repercussão no coração, que tem responsabilidade de levar oxigênio para o cérebro e para o resto do corpo, pode causar um dano cerebral, se o cérebro não receber oxigênio suficiente”, diz.
Automedicação e doses duplas
De acordo com Trindade, dois dos grandes riscos envolvendo consumo de remédios são a automedicação e as doses aumentadas. Sobre o primeiro, a recomendação é só tomar medicamentos após recomendação médica (a automedicação consiste em usar remédios sem que algum médico o tenha recomendado anteriormente). Já quanto ao segundo, o médico alerta para a ilusão de que uma dose maior possa gerar efeitos aumentados, o que não é verdade.
“Muitas pessoas tomam um dose dobrada ou triplicada de um medicamento achando que vai potencializar o efeito. Não potencializa, e ainda aumenta os riscos de um efeito adverso. A sequela neurológica é uma das mais graves, a não ser pelo óbito, mas superdosagens podem gerar, por exemplo, uma insuficiência hepática, que é o fígado parar de funcionar”, diz.
Os especialistas consultados pelo g1 explicam que os efeitos adversos mais comuns acontecem no fígado e nos rins, que são espécies de “filtros” do corpo humano, por onde passam todas as substâncias ingeridas. Mas há outros efeitos possíveis, como danos ao estômago após o uso contínuo de medicamentos contra a dor, por exemplo, o que pode causar uma úlcera.
“Existem doenças relacionadas ao consumo de remédio bem conhecidas e documentadas. O fígado e o rim são por onde tudo passa, então o uso incorreto pode causar cirrose ou insuficiência renal, mas também doenças cardíacas e cognitivas”, explica Toríbio.
Recomendações
Para evitar problemas, o indicado é ler a bula e se consultar com especialistas.
“Cada remédio tem um impacto diferente, por isso é muito importante ter cuidado com toda a medicação. Mesmo usando a dose indicada na bula, podem ocorrer efeitos adversos ou inesperados”, explica Trindade.
As principais recomendações dos médicos são:
- Evitar a automedicação: usar apenas remédios que já tenham sido recomendados por um médico anteriormente. Evitar dicas de familiares ou conhecidos.
- Ler a bula. Não é recomendado tomar quantidades maiores do que as recomendadas pelo fabricante. Doses maiores não significam efeitos potencializados, mas geram mais riscos de efeitos adversos. Mesmo medicamentos de acesso mais fácil, como analgésicos e antialérgicos, podem causar danos graves.
- Comprar apenas a quantidade necessária para o momento. Guardar remédios em casa pode gerar problemas de armazenamento adequado. Além disso, há o risco de que o produto passe da data de validade. Também é um estímulo à automedicação, o que não é recomendado.
O que fazer em caso de superdosagem
De acordo com os médicos consultados pela reportagem, em caso de superdosagem a principal recomendação é procurar um serviço de saúde imediatamente após a ingestão. Unidades de pronto-atendimento (UPA) e hospitais de pronto-socorro são capacitados para atender esse tipo de episódio. O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) pode ser acionado pelo telefone 192.