Especialistas apontam regulação falha, uma vez que preço máximo de medicamentos definido pela Cmed é muito acima do valor de mercado
A Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed) deve, anunciar nesta sexta-feira (31/3), o reajuste anual no preço dos medicamentos do país. A medida, contudo, pode não afetar diretamente os valores praticados nas farmácias, uma vez que a Cmed define o valor máximo que cada remédio pode atingir no mercado, e não age como tabelamento de preços.
O cálculo usa uma fórmula que se baseia na inflação, por meio do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado em 12 meses, até fevereiro de cada ano. Levantamento divulgado pelo Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), com informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estima o reajuste de 5,6% a partir deste sábado (1º/4).
O sindicato definiu o último ano como “atípico” para a indústria farmacêutica. “Numa frente, os efeitos persistentes da pandemia de SARS-CoV-2 afetaram a produção e impulsionaram os preços de IFAs; na outra, a Guerra da Ucrânia manteve os gastos com logística em patamares muito altos”, descreve a nota.
O preço máximo definido pela Cmed, também chamado de preço teto, muitas vezes é bem maior que o valor de mercado dos medicamentos. Dessa forma, a indústria farmacêutica poderia realizar grandes aumentos sem penalização, uma vez que o teto tem grande espaço.
“O que acontece muitas vezes é que o medicamento entra no país, fabricado apenas por uma farmacêutica, com um preço maior. Acabou o monopólio, vem a concorrência e a tendência é baixar o preço praticado. O problema é que o preço do teto não vai abaixar. Com o passar do tempo, o [preço do] medicamento tende a baixar, mas a margem do teto vai só aumentando”, explica Ana Carolina Navarrete, coordenadora do programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Para a especialista, o atual modelo apresenta duas grandes falhas: não possibilita que o teto seja puxado para baixo, e compara o cenário brasileiro, no momento do registro do medicamento e definição do preço máximo, com países que não são semelhantes à realidade do país.
“Chegamos à conclusão que o aumento do preço não tem controle. Se o teto é muito alto, não tem teto nenhum. A regulação não está fazendo efeito. A regulação é para tensionar, puxar o preço para baixo”, defende. “Na pandemia, o que vimos acontecer foi exatamente isso. Muitos aumentos em vários medicamentos para uso hospitalar, tudo dentro do teto. Qualquer desequilíbrio cambial ou desabastecimento, a política não consegue segurar.”
Em pesquisa divulgada nesta semana, o Idec mostrou a divergência entre os valores praticados no varejo ou em compras públicas e os preços máximos definidos. O Omeprazol 20 mg, por exemplo, pode ser encontrado nas farmácias por, em média, R$ 25. O teto do medicamento, porém, é de R$ 121. “É uma diferença de quase 400%! O Omeprazol pode aumentar amanhã e tudo certo, porque está dentro do teto”, explica Ana Carolina.