Governo do Estado teria deixado de investir mais de R$6 bi em educação e descumprindo o mínimo constitucional e falta de dados oficiais foram destaque no Fiscaliza Mais que monitora PEE
Apesar de dados em contrário apresentados pelo Executivo, o Governo do Estado não estaria cumprindo há anos o mínimo constitucional de investimento em educação, resultando num deficit acumulado de 2019 até aqui de quase R$ 6,5 bilhões não destinados à área.
Divergências em torno do financiamento e da qualidade do ensino foram evidenciadas nesta terça-feira (2/8/22), em audiência da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada para monitorar o cumprimento de metas do Plano Estadual de Educação (PEE) no âmbito do Fiscaliza Mais.
Assessora estratégica da Secretaria de Estado de Educação (SEE), Clara Oliveira Costa disse, entre outros, que o investimento na área superou o mínimo de 25% da receita corrente líquida do Estado determinado pela Constituição Federal. O percentual, segundo ela foi de 26,12% em 2021.
Contudo, a presidenta da comissão, deputada Beatriz Cerqueira (PT), afirmou que esse indicador ficou em 23,21% no ano passado e em 24,51% este ano até agora, segundo estimativas do Dieese.
A deputada afirmou que o governo incluiria na conta despesas como a previdenciária, que não deveriam compor o percentual, gerando as divergências. Ela ainda mostrou apresentação em que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) teria apurado que em 2019 o investimento em educação ficou em 19,80% da receita e o Ministério Público de Contas teria apontado que o índice de 2020 foi de 20,73%.
O Plano Estadual de Educação foi instituído pela Lei 23.197, de 2018, para o período de 2018 a 2027. Contém 10 diretrizes e 18 metas, que abrangem níveis e modalidades de educação, formação e valorização dos profissionais de educação, gestão democrática e financiamento.
Estado é cobrado por falta de transparência
O objetivo da audiência era debater informações solicitadas anteriormente à SEE por meio de requerimento da comissão, mas segundo sua presidenta, que pediu a reunião, o debate amplo não foi possível pela falta de transparência e dados incompletos nas respostas dadas pela Secretaria de Estado de Educação.
Nesse sentido, Beatriz Cerqueira mostrou trabalho de análise da consultoria técnica da Assembleia, que após se debruçar sobre documento de respostas enviado pela pasta concluiu que em grande parte as informações acerca de cada meta do PEE não trouxeram dados objetivos quanto a medidas adotadas e resultados alcançados.
Ainda conforme a análise, a forma adotada no relatório oficial também não revelou o investimento do Estado em cada meta ou estratégia.
“Ou seja, faltou transparência nas informações”, frisou a presidenta da comissão, que ainda fez um resumo das conclusões das audiências realizadas em outubro e novembro do ano passado também para acompanhar o cumprimento do Plano Estadual de Educação.
Entre outros, Beatriz Cerqueira destacou terem ficado evidentes a desarticulação do Estado no apoio aos municípios para o cumprimento do plano, o retrocesso nos ensinos integral e inclusivo e a fragilização das condições de trabalho dos professores.
Ela ainda criticou o fato de indicadores apresentados pela SEE não terem recortes como de raça e renda.
Desafios
Em resposta aos questionamentos, a assessora estratégica da SEE disse que já foi criada uma assessoria de articulação municipal para atuar nas metas do plano, e disse que poderá haver a institucionalização dessa instância para maior visibilidade.
Sobre desarticulação entre dados, Clara Oliveira Costa disse que o Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG), cuja revisão é enviada todo ano à ALMG, já traria programas e ações em educação de acordo com o que estabelece o plano. “Talvez possamos deixar isso mais explícito no PPAG a ser enviado a esta Casa”, se dispôs ela.
Quanto a uma possível falta de transparência nos dados, a representante do Executvo disse que a SEE criou recentemente um painel de monitoramento do plano, que segundo ela não teria se tornado público nesse momento em função de vedações eleitorais, o que deverá ocorrer a partir de outubro. Esse painel, segundo ela, tem os recortes cobrados na audiência, por exemplo quanto a raça e renda.
Em sua apresentação, a assessora da SEE disse que a pandemia de Covid-19 trouxe ainda mais desafios para a educação no Estado e reconheceu que várias das bases de dados trabalhadas pela pasta estão defasadas, entre outros em função dos atrasos na atualização do censo do IBGE.
Retrocesso
Quanto à universalização do acesso ao ensino fundamental, a assessora da secretaria disse que esta foi uma das metas mais impactadas em todo o País, pois retrocedeu 10 anos em função da pandemia.
Em Minas não foi diferente, disse ela, ressalvando que mesmo assim o Estado tem o maior percentual no País de alunos ente 6 e 14 anos na escola ou tendo concluído esse ciclo. Isso, segundo a gestora, graças ao esforço de busca ativa, que resultou no retorno à escola no ano passado de mais de 45 mil estudantes nessa faixa, que haviam deixado a escola na pandemia.
Por outro lado, ela enfatizou que 93,5% dos alunos na faixa etária do ensino médio em 2020 e 95,5% em 2021 foram atendidos, apesar das consequências da pandemia.
Já na Educação de Jovens e Adultos (EJA) está a pior situação, tendo sido poucos os avanços. Apesar disso, a gestora frisou que 22,22% das matrículas nessa modalidade são ofertadas já de forma integrada à educação profissional, para uma meta que é de 25% das matrículas.
Especialistas defendem atualização de indicadores
A representante da SEE ainda apresentou dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) para mostrar a evolução da qualidade da educação em 2021, mas a presidenta da comissão e educadores como Rudá Ricci, doutor em Ciências Sociais e presidente do Inbstituto Cultiva, questionaram o uso de indicadores nesses moldes.
Criado em 2007, o Ideb reúne, em um só indicador, o fluxo escolar e as médias das avaliações de desempenho dos estudantes. De acordo com o Instituto Nacional de Ensino e Pesquisas (Inep), a meta é que o Ideb alcance a média 6, o que corresponderia a uma qualidade comparável a de países desenvolvidos.
“A pandemia inviabilizou o uso do Ideb porque ela (pandemia) desmontou os vínculos de nossos alunos. Mesmo aqueles trazidos de volta à escola se dessocializaram. Por isso, vamos com calma em relação ao uso de indicadores que não trabalham com a dinâmica social e classificam o aluno em relação a um padrão externo. Assim, estamos fazendo uma discussão desumanizada do plano estadual de educação”, advertiu Rudá Ricci.
O especialista ainda defendeu que metas e indicadores de resultado do próprio PEE precisarim ser revistos em situações especiais, como a de uma pandemia, inclusive para que esta não sirva de álibi para o erro. Assim como há revisões no PPAG e em ciclos orçamentários, comparou ele.
No mesmo sentido, o presidente do Conselho Estadual de Educação, Felipe Braga, defendeu que Minas deveria puxar esse debate sobre indicadores, olhando sim para o acesso ao ensino, mas também para a equidade. “Isso para que as consequências da pandemia não passem despercebidas”, propôs.
Por sua vez, o deputado Guilherme da Cunha (Novo) parabenizou a secretaria pelos resultados mostrados e frisou entre outros que mais de mil escolas públicas foram reformadas em Minas.
*informações ALMG