A grande maioria das reações relacionadas aos imunizantes contra a Covid-19 foi classificada como não grave. Benefícios superam riscos
Do portal Metrópoles –
Os benefícios da vacina contra a Covid-19 superam em muito os riscos de eventos adversos graves. O Ministério da Saúde aponta que 92% das reações registradas desde o início da vacinação foram classificadas como não graves. Já a queda da mortalidade de pacientes com Covid-19 no SUS foi de 37% no país. O risco de óbito pela doença é 56 vezes maior do que o risco de ocorrência de um evento adverso relacionado à vacinação. Apesar dos avanços, a campanha infantil tem esbarrado em leis conflitantes sobre a obrigatoriedade da imunização.
Conteúdo analisado: Diversas publicações feitas em redes sociais têm questionado efeitos adversos graves e até mortes ocorridas após a vacinação por imunizantes disponíveis. Essas dúvidas têm sido manifestadas nas redes por pessoas que temem a vacinação, mas também são usadas por grupos antivacinas para criar pânico e rejeição à imunização.
Desde o início da vacinação contra a Covid-19 no Brasil, quase a totalidade (92%) dos eventos adversos relacionados aos imunizantes foi classificada como não grave, segundo o Ministério da Saúde. Os relatos mais comuns são de cansaço, tosse, calafrios, dor no local da aplicação, coceira, hematoma, febre, dor no corpo, diarreia, náusea, dores musculares e nas articulações e dor de cabeça. Em pouco mais de um ano de campanha, os benefícios podem ser vistos de forma prática. A queda da mortalidade de pacientes hospitalizados com Covid-19 no SUS, por exemplo, foi de 37% em todo o país. Um estudo do governo federal mostra que o risco de óbito pela doença é 56 vezes maior do que o risco de ocorrência de um evento adverso relacionado à vacinação.
O mesmo documento apontou que os efeitos de menor gravidade pelos imunizantes estão concentrados na faixa etária de 25 a 44 anos. Já a população idosa apresentou a maior taxa de reações consideradas graves, em especial aqueles com mais de 75 anos de idade.
As vacinas AstraZeneca/Fiocruz e Coronavac respondem pela maior parte das notificações, seguidas das doses da Janssen e Pfizer, respectivamente. A maioria das reações leves teve início no período de 48 horas após a vacinação. Nos casos graves, esse intervalo foi maior, de 17 dias.Os dados da pesquisa foram coletados entre 18 de janeiro e 25 de outubro de 2021. O texto pondera que as comparações devem levar em conta a proporção da cobertura vacinal de cada imunizante. Os três primeiros meses da campanha nacional não contaram com doses da Pfizer, por exemplo. Nem os seis primeiros meses tiveram Iotes da Janssen disponíveis, o que poderia explicar, em parte, a grande diferença das taxas de reações.Casos graves são aqueles que exigem hospitalização ou podem levar à morte. De acordo com o estudo do governo federal, a incidência, no Brasil, é de 5,1 a cada 100 mil doses administradas, ou seja, 0,005% do total de aplicações.
Até novembro de 2021, o Ministério da Saúde informava 11 óbitos relacionados à vacinação em um cenário de mais de 325 milhões de doses aplicadas.
O Comprova solicitou ao Ministério da Saúde e à Anvisa os dados atualizados sobre eventos já comprovados que tenham relação com as vacinas contra a Covid-19, mas não obteve retorno. No dia 25 de janeiro a reportagem também fez o pedido via Lei de Acesso à Informação (LAI) e o governo tem 20 dias para responder, o que ainda não ocorreu. Entre as crianças, a vacina pode reduzir em seis vezes a chance de complicação por Covid-19, de acordo com dados levantados nos Estados Unidos, país onde há o maior número de jovens imunizados. Os casos reportados de miocardite são raros: a incidência é de 9 a cada 100 mil doses aplicadas (0,009%).Todas as vacinas ofertadas pelo Programa Nacional de Imunizações que têm autorização de uso pela Anvisa passam por um rígido processo de avaliação de qualidade pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) da Fiocruz. O PNI existe desde 1973 e é considerado referência mundial em campanhas de vacinação pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), braço da Organização Mundial da Saúde (OMS) nas Américas.
Quais os benefícios e riscos das vacinas?
Como qualquer medicamento, vacinas podem causar reações. A coordenadora do Núcleo Técnico de Produtos Biológicos do INCQS, Maria Aparecida Affonso Boller, explica, em entrevista ao site do órgão, que antes de as doses serem enviadas ao PNI, as amostras são separadas para um controle da qualidade que garante a segurança e eficácia dos lotes. Nesta fase, são realizados testes de potência, estabilidade, esterilidade, pH, volume, entre tantos outros.
Na vida real, a vacina contra a Covid-19 tem sido comprovadamente eficaz no combate à doença. Um levantamento da Secretaria de Saúde de São Paulo feito no Instituto de Infectologia Emílio Ribas mostrou que a probabilidade de óbito foi 14 vezes maior em pessoas sem a vacinação, em comparação com quem estava com o esquema completo. A chance de hospitalização também foi maior entre os não vacinados: nove em cada dez pacientes internados não tinham tomado nenhuma dose nos meses em que o estudo foi feito.
Ao Comprova, o médico pediatra Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), observa que um número muito grande de pessoas já recebeu as vacinas ao redor do mundo – mais de 10 bilhões de doses foram aplicadas – e os eventos adversos na imensa maioria são leves a moderados. “Não significa que eventos adversos graves não possam acontecer com qualquer dessas vacinas. Podem acontecer, mas são raros”.
O Ministério da Saúde cita como possíveis complicações tromboses venosas, miocardite e pericardite, síndromes neurológicas como a síndrome de Guillain-Barré, encefalite, hemorragias cerebrais, arritmia, infarto agudo do miocárdio, embolia pulmonar, entre outros. Ainda assim, estes eventos são muito raros, ocorrendo, em média, 1 caso a cada 100 mil doses aplicadas, com risco significativamente inferior à chance de complicações pela própria Covid-19.
O boletim epidemiológico com o dado mais recente de óbitos relacionados à vacina é de novembro de 2021 e traz informações preliminares. O documento cita 11 mortes, 0,3% das reações graves notificadas ao Ministério da Saúde até aquele momento. Os casos estão relacionados à síndrome de trombose com trombocitopenia. Do total de vítimas, oito foram vacinadas com doses da AstraZeneca e três com Janssen.
Os especialistas lembram que as vacinas também são uma ferramenta de combate às mutações do vírus. Hoje, são cinco as variantes de preocupação, segundo a OMS: Alpha, Beta, Gamma, Delta e Ômicron. As taxas de eficácia das vacinas para essas mutações variam de 68% a 98%, dependendo da fabricante.
Casos especiais: miocardite, pericardite, trombose com trombocitopenia e Guillain-Barré
Miocardite e Pericardite
Em julho de 2021, a Anvisa informou que os Estados Unidos relataram a ocorrência de casos de miocardite (inflamação do músculo cardíaco) e de pericardite (inflamação do tecido que envolve o coração) após a vacinação contra Covid-19 com imunizantes de plataforma de RNA mensageiro (RNAm), que inclui o produto da Pfizer utilizado no Brasil.
Sobre os riscos destas complicações, a farmacêutica explicou que os diagnósticos são raros e ocorrem dentro de 14 dias após a vacinação, mais frequentemente depois da segunda dose, e em homens mais jovens.
No Brasil, foram 90 notificações de eventos adversos com alguma menção a miocardite ou pericardite em 11 meses de campanha. Pouco mais da metade (53%) ocorreu após a aplicação da vacina da Pfizer; outros 31% com AstraZeneca, e 15%, Coronavac. Desse total, 7 evoluíram a óbito, mas todos tiveram a pericardite descartada como causa da morte pelo Ministério da Saúde.
Trombose com trombocitopenia
A incidência aproximada de casos de trombose com trombocitopenia é de 1 caso a cada 100 mil doses aplicadas, ou seja, 0,001% dos indivíduos vacinados. Devido à raridade das ocorrências, ainda não foi possível identificar fatores de risco associados à síndrome.
A maioria dos países na Europa relata casos da doença em pessoas que receberam a vacina de vetor viral não replicante, como é o caso da AstraZeneca, e mais recentemente nos Estados Unidos com a vacina da Janssen.
No Brasil, até 4 de outubro de 2021, o Ministério da Saúde identificou 77 notificações individuais de eventos adversos com menção a quadros compatíveis com trombose e trombocitopenia.
Desse total, 18 foram considerados como associação causal consistente (incluindo 11 óbitos), 17 como indeterminado (6 óbitos), 7 como inconsistente ou coincidente (1 óbito), 11 como inclassificáveis (4 óbitos) e 24 ainda estavam em investigação na época.
Um dos casos registrados que resultou em óbito é do advogado Bruno Graf, de 28 anos, que faleceu em Santa Catarina em agosto de 2021 e cujo caso ganhou alcance nas redes sociais. Segundo boletim epidemiológico, Bruno sentiu calafrios, sensação febril e cefaleia no dia 23 de agosto, e morreu três dias depois. O documento afirma que o quadro foi desencadeado por uma trombose de sistema nervoso central com plaquetopenia associada.
O mesmo boletim aponta outra morte, de uma mulher de 27 anos, como tendo relação causal com as vacinas para Covid-19. Ela apresentou febre, dor abdominal e dor nas costas em 10 de setembro e faleceu em 23 de setembro, também por trombose com trombocitopenia. Ambos os óbitos foram associados à vacina Astrazeneca.
Guillain-Barré
Em julho de 2021, a Anvisa emitiu alerta sobre casos raros de Síndrome de Guillain-Barré pós-vacinação. Os eventos adversos foram relacionados às vacinas AstraZeneca, Janssen e Coronavac.
Até aquele momento, haviam sido feitas 27 notificações de suspeitas de relação da doença com a vacina da Astrazeneca, além de três casos com a vacina da Janssen e outros quatro com a Coronavac, totalizando 34 registros. Segundo a Anvisa, a doença também está relacionada a doses aplicadas contra Influenza.
Trata-se de um distúrbio neurológico autoimune raro, no qual o sistema imunológico danifica as células nervosas. A maioria das pessoas se recupera totalmente. O principal risco é quando ocorre o acometimento dos músculos respiratórios e, nesse caso, a síndrome pode levar à morte.
Quais reações outras vacinas podem causar?
O Programa Nacional de Imunização inclui 45 vacinas para todas as faixas etárias da população brasileira. O Comprova pesquisou como se comportam algumas delas em relação aos efeitos adversos graves: a da gripe, a tríplice viral e a da febre amarela.
Anualmente, cerca de 80 milhões de brasileiros são vacinados contra a Influenza, dose produzida pelo Instituto Butantan. As reações mais comuns são dor de cabeça, mialgia, mal-estar, fraqueza, calafrios e febre.
O presidente da SBIm diz que reações de maior gravidade são raras, mas há, por exemplo, a chance de uma anafilaxia, uma alergia grave. “Há possibilidade de cinco casos de anafilaxia a cada milhão de doses aplicadas [contra a gripe]; são números muito parecidos entre as vacinas que a gente já utiliza e a vacina da Covid”.
Já a bula da tríplice viral, que combina sarampo, rubéola e caxumba, descreve a possibilidade incomum – entre 0,1% e 1% dos imunizados – de inflamação no ouvido, gânglios linfáticos inchados, especialmente no pescoço, nas axilas e na virilha, perda de apetite, nervosismo, choro anormal, insônia, conjuntivite, bronquite, tosse, inchaço das glândulas que produzem a saliva, diarreia e vômito.
No caso da vacina contra a febre amarela, a dose tem um perfil particular por ser atenuada. “Ela pode ter como efeito grave uma doença semelhante à doença que a vacina protege, diferente da vacina da Covid. E podem ser quadros graves. Mas é importante salientar que a imensa maioria dos eventos adversos são leves a moderados, como febre, dor no local, mal-estar, cansaço, o que pode acontecer com qualquer uma das vacinas que a gente usa, inclusive a da Covid”, segundo Juarez Cunha.
Durante os estudos também foi identificada a possibilidade rara – entre 0,01% e 0,1% dos vacinados – de reações alérgicas e convulsões associadas à febre. Relatos pós-comercialização apresentaram outras reações raras como meningite; síndrome similar ao sarampo, síndrome similar à caxumba; epididimite e parotidite; síndrome de Guillain Barré, entre outras.
Vacinas pediátricas são seguras?
A cada dois dias uma criança morreu por complicações da Covid-19 no Brasil em 21 meses de pandemia, até 6 de dezembro de 2021. Em números absolutos, foram 301 vítimas na faixa etária de 5 a 11 anos. O número de casos da doença neste público ultrapassa a marca de seis mil.
Para além das complicações diretas da infecção, o Ministério da Saúde também alerta para os registros de Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica associada à Covid-19 em crianças e adolescentes de zero a 19 anos. Até janeiro de 2022, foram confirmados 1.466 casos, com 88 óbitos. A maioria tinha nove anos de idade e 25% delas apresentava doenças prévias, como obesidade e cardiopatias.
Apesar dos números, o Brasil ficou atrás de países da Europa e dos Estados Unidos para dar início à vacinação infantil. As primeiras doses pediátricas da Pfizer começaram a ser aplicadas no início de janeiro de 2022, e a Coronavac foi incorporada à campanha quase um mês depois. Ambas receberam autorização da Anvisa.
O infectologista Juarez Cunha, que é médico pediatra, explica que nos estudos conduzidos pela Pfizer não foram demonstrados eventos adversos graves relacionados ao público infantil. Destaca, contudo, que os estudos utilizam de 2 mil a 5 mil participantes, e que o cenário pode mudar quando milhões de doses passam a ser aplicadas.
De acordo com o The New York Times, desde novembro de 2021, os Estados Unidos vacinaram totalmente mais de 5 milhões de crianças na faixa etária de 5 a 11 anos. O médico destaca que a farmacovigilância do país é muito rigorosa e, como esperado, identificou apenas eventos adversos leves a moderados. “Nenhum relato de morte causada pela vacina”, afirma.
A campanha americana também mostrou que crianças imunizadas contra a Covid-19 têm seis vezes menos chances de contrair a doença com gravidade. Cunha acrescenta: “Vacinar a criança protege não apenas ela, mas tem grande possibilidade de, assim, evitar a transmissão para outras pessoas, colegas de escola ou mesmo família”.
O que diz a legislação sobre vacinação infantil?
Com o início da vacinação infantil no Brasil, pais, responsáveis e autoridades têm debatido se a campanha contra a Covid-19 nesse público deveria se tornar obrigatória. De acordo com o primeiro parágrafo do artigo 14 do Estatuto da Criança e Adolescente, a imunização em menores de 18 anos é exigida caso haja recomendação feita pelas entidades sanitárias, como é o caso da Anvisa.
Uma decisão no Supremo Tribunal Federal de janeiro deste ano orientou os Ministérios Públicos que acompanhem casos de pais que se recusam a vacinar os filhos contra a Covid-19. O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Sarrubbo, disse ao Comprova que uma das punições possíveis é a perda temporária da guarda. Na avaliação da promotoria, deve prevalecer o direito à saúde, como previsto no ECA.
Ao mesmo tempo, o STF entende que a vacinação não deve ser forçada, permitindo a recusa do usuário, mas também possibilitando a restrição de atividades previstas em lei.
Pessoas contrárias à campanha infantil contestam a exigência alegando que a Lei n°6259 de 30 de outubro de 1975 torna obrigatórias apenas as vacinas que estão no Programa Nacional de Imunização, que é de responsabilidade do Ministério da Saúde.
Em janeiro deste ano, porém, o governo anunciou a inclusão da dose pediátrica no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 (PNO), e não no PNI. A própria pasta diz que a imunização da faixa etária de 5 a 11 anos não é obrigatória.
Nestes casos, explica o procurador-geral de Justiça de São Paulo, é usada a Lei de Introdução ao Código Civil, que aborda regras conflitantes. O texto determina que “uma lei posterior revoga uma lei anterior”. Assim, entende o jurista, o ECA, que é de 1990, tem a preferência. Outro ponto disposto na Lei de Introdução ao Código Civil é que uma lei genérica pode ser revogada por uma lei específica, como é o caso do estatuto.
Por que investigamos?
O Comprova faz a verificação de conteúdos suspeitos que tenham viralizado sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições.
Desde o início da vacinação contra a Covid-19, as redes sociais foram tomadas por dúvidas sobre eficácia das vacinas e também sobre os possíveis riscos de eventos adversos. Este Comprova Explica tem o objetivo de informar sobre esses tópicos.
As vacinas têm a eficácia e a segurança testadas e comprovadas por diversos órgãos e entidades, como a Anvisa, FDA, dos Estados Unidos, e EMA, da Europa.
Desde o início de 2021, o Comprova checou diversas peças de desinformação sobre os imunizantes empregados no Brasil contra a Covid-19.
Alguns exemplos de verificação são a que demonstra ser falsa a declaração de um médico afirmando que as vacinas são “lixo”, a que informa que o Ministério da Saúde descartou a relação entre a morte de um adolescente e a vacina e ser falsa uma postagem que dizia que as vacinas causavam dano ao sistema imunológico, entre outras que podem ser conferidas aqui, aqui, aqui e aqui.
Esta reportagem considerou os dados sobre vacinas e a Covid-19 disponíveis até 31 de janeiro de 2022.