Especialistas apontam que governantes precisarão superar falta de estrutura e superlotação das salas para oferecer um ensino de qualidade.
A educação brasileira se apresenta como um dos principais desafios para os governantes, com dificuldades na infraestrutura, superlotação das salas de aula, evasão escolar e outros problemas enfrentados há anos e agravados com a pandemia de Covid-19. Com a entrada de um novo governo ou a manutenção do atual, especialistas apontam que as adversidades a serem superadas não serão poucas.
As medidas de restrição em decorrência da pandemia se apresentaram como um dos principais obstáculos para o avanço da educação do país. Com escolas fechadas e pouco acesso à internet, professores se desdobraram para tentar levar um conteúdo de qualidade aos estudantes.
Dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) em setembro, apontam que de 2019 a 2021 o índice de crianças que não sabem ler e escrever mais do que dobrou. Passou de 15,5% para 33,8% entre os alunos do 2º ano da educação infantil, que tem sete e oito anos.
Além do baixo nível de proficiência, levantamento realizado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) mostra que dois milhões de estudantes com idades entre 11 e 19 anos no Brasil abandonaram a escola durante a pandemia de Covid-19.
Especialista ouvida pelo Metrópoles aponta que a falta de sociabilização dos alunos nas séries iniciais foi uma das principais dificuldades na pandemia.
“Então, isso eu digo que hoje é um um prejuízo ligado à situação sócioemocional dos alunos e não de maneira individual. Eu gosto até de dizer que a gente recuou alguns séculos no processo civilizatório de respeito, de resiliência, de cuidado e atenção ao outro”, explica Maria Cristina Tempesta, doutora em educação.
“Em dois anos perdemos alguns séculos que serão difíceis de recompor, mas é um desafio que precisa ser enfrentado”, declarou Tempesta.
Educação teve pouco debate durante as eleições
A professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB) Catarina de Almeida destaca que o ensino de qualidade se apresentou ao longo dos anos como um privilégio de alguns e não um direito de todos.
“No dia que esse país encarar a educação como um direito, ou seja, que todas as pessoas precisam ter acesso à educação de qualidade, aí a educação vai estar na boca de todo mundo, vai estar pautada nas eleições”, salienta Catarina.
A docente da UnB reforça que a educação é um antídoto contra a corrupção no país, já que pessoas conscientes da realidade da nação irão eleger políticos contra o desvio de dinheiro público e a fim de melhorar a realidade das classes inferiores.
“Para quem quer manter a estrutura desigual que o país tem, de que alguns têm muito e a maioria não tem nada, de manter os privilégios, não vai querer educação. Uma população que tem uma boa educação não vai aturar privilégios”, analisa Catarina de Almeida.
Para Tempesta, uma sociedade com acesso a educação de qualidade é um problema para os governantes.
“Não acho que no Brasil os políticos estão interessados que tenhamos uma população que saiba ler bem, interpretar bem, se colocar com clareza, usar argumentos para defender o seu ponto de vista”, destaca Maria Cristina Tempesta
“Nós ainda temos no Brasil uma característica de políticos que preferem, desejam a manutenção e a permanência de eleitores que sejam mais servis, menos autônomos”, acrescenta Tempesta.
Superar os desafios
Para um ensino de qualidade no Brasil é importante que os governantes passem a investir na formação dos profissionais da educação, para desenvolver uma ideia mais abrangente dos ensinos segundo Maria Cristina Tempesta.
“O Brasil não tem duas escolas, uma que forma o professor da escola pública e outra que forma o professor da escola privada ou brasileiro sai das mesmas instituições. O que muda na trajetória profissional deles é a formação em serviço”, explica Tempesta.
Para Catarina de Almeida é importante que os governantes sigam o Plano Nacional de Educação sancionado em 2014 para um avanço no ensino brasileiro.
“Então, a política essencial para melhoria da qualidade da educação está no seu Plano Nacional de Educação que nesses oito anos esse plano foi não só ignorado, mas tivemos ataques para que as metas não fossem implementadas e a gente regredisse no que nós precisaríamos avançar”, acrescenta Catarina.
Propostas dos presidenciáveis
Para o especialista em educação Guilherme Lichand as propostas apresentadas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e candidato à reeleição tem como objetivo consertar falhas. “Bolsonaro teve tempo para fazer tudo que propõe nos últimos três anos. Acredito que o eleitor tem motivos para desconfiar de suas intenções.”
Lichand declara que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende reviver o passado, com ações que deram certo na educação. “Lula criou um processo que foi avançando nas outras gestões. As cotas nas instituições federais de ensino foram importantes, apesar de ainda termos poucos alunos concluindo o ensino superior, para tornar as instituições federais de ensino mais diversas, houve uma inclusão bastante importante no seu governo”, acrescenta.
Entretanto, o especialista em educação declara que as propostas dos candidatos à Presidência apresentam propostas vazias voltadas para o ensino. “Nos dois casos, Lula e Bolsonaro não propõem nada, mais se parece cartas de intenções”.