Construtoras e incorporadoras admitem que o mercado para venda de studios pode ser mais difícil em regiões da cidade de São Paulo mais distantes de linhas de metrô, faculdades, hospitais e outros polos de atração de público para moradia e ressaltam que a legislação turbinou os lançamentos.
Nos últimos cinco anos, até setembro de 2022, foram lançadas 60.796 unidades de studios com até 30 metros quadrados na capital, com 46.423 vendidas, segundo o Secovi (Sindicato das Empresas de Compra, Venda e Administração de Imóveis).
Entre 2018 e 2022, de janeiro setembro de cada ano, os lançamentos de studios somaram 35.757 unidades, enquanto as vendas totalizaram 32.821 unidades. “Percebemos que o que foi lançado foi vendido”, diz Ely Wertheim, presidente executivo do Secovi-SP. Mas ele admite que, dependendo localização, nem todo empreendimento vai ter o mesmo desempenho de vendas.
O executivo atribui o aumento da oferta de studios ao “equívoco” do Plano Diretor. A legislação restringiu uma vaga de garagem por unidade em empreendimentos próximos a estações de trem, metrô e corredores de ônibus.
Com isso, as incorporadoras passaram a incluir studios sem garagem nos projetos para conseguir oferecer uma vaga a mais para os apartamentos maiores. Outro benefício dado aos empreendedores por ter studios no projeto é o fato de este tipo de imóvel não ser considerado pela legislação como área construída, o que permite melhor aproveitamento do terreno.
O resultado de tantos estímulos foi o aumento de lançamentos. Em 2016, os studios respondiam 12% do total lançado. Neste ano, a fatia subiu para mais de um terço (34%) dos novos produtos, aponta levantamento da DataZAP+.
“Chegamos a essa mega oferta de compactos porque o Plano Diretor induziu as construtoras a fazer studios”, afirma o vice-presidente de operações da construtora Mitre, Rodrigo Cagali.
Localização
O foco da empresa sempre foi apartamentos maiores. Mas, por conta dos benefícios, foram incluídos os compactos nos projetos. Dos R$ 4 bilhões de VGV (Valor Geral de Vendas) lançados em 2020, 2021 e 2022, 20% são imóveis compactos. “É bastante coisa, mas estamos bem vendidos e não temos dor de cabeça.”
Cagali diz que o bom desempenho está atrelado também à localização. Ele está preocupado com o risco de uma grande oferta, pois outras empresas lançaram studios em regiões sem vocação para esse imóvel.
Tellio Totaro Jr., superintendente de Incorporação da EZtec, concorda. No entanto, acredita que num horizonte próximo há mercado satisfatório para lançamentos de imóveis compactos. “Continuamos com bom volume de vendas e não temos sentido queda na demanda”, diz Totaro Jr. Nos últimos três anos, a empresa lançou 1.600 studios e já vendeu 60% deles.
“Hoje não sinto uma superoferta de compactos porque muitos empreendimentos não foram entregues”, diz o diretor de vendas da Cyrela, Orlando Pereira. Em sua opinião, há risco de ter uma superoferta nos próximos dois anos. No momento, ele diz que a sua empresa está na “contramão do mercado”. Neste ano, vendeu 1.700 studios de quase 2.000 lançados no Brooklin, Moema, Perdizes e Jardins.
Fim da febre
Começaram a aparecer na capital paulista os primeiros sinais de descompasso entre a oferta e a demanda para venda e locação dos studios e apartamentos compactos na cidade de São Paulo. Esse movimento trouxe à tona a discussão se estaria se repetindo hoje o “boom” que houve no passado com flats e salas comerciais, que frustrou investidores.
Levantamento feito pelo Zap+ mostra que entre o primeiro trimestre de 2019, antes da pandemia, e o terceiro trimestre deste ano, a procura para compra de apartamento do tipo estúdio, de até 30 m², e com um dormitório, de até 50 m², caiu 52%, enquanto a oferta cresceu 55%.
A base de dados foi anúncios e buscas pelos imóveis nos três portais da empresa – ZAP Imóveis, Viva Real e OLX Brasil. “Está muito mais difícil vender esse tipo de imóvel”, afirma Larissa Gonçalves, economista da DataZap+ e responsável pelo estudo.
Em suas contas, a liquidez na compra e venda de compactos caiu 83% entre janeiro de 2019 e setembro deste ano e está no nível mais baixo do período em análise. A liquidez leva em conta a relação entre a demanda e a oferta registrada nos portais, desconsiderando anúncios repetidos.
Para impulsionar as vendas, já há construtoras que correram para fechar parcerias com empresas especializadas em locação desses studios por temporada. Um ano e meio atrás, a Mitre, por exemplo, se antecipou aos concorrentes e fechou acordo com a Atlântica Hotéis.
Foi a forma de sinalizar rentabilidade atraente aos investidores – a maior fatia de compradores desse tipo de imóvel – para concorrer com o juro, que hoje é de 13,75% ao ano. Também há incorporadoras, como a Cyrela, que avaliam a possibilidade de retirar studios de novos projetos para evitar risco de mega oferta.
Locação
O levantamento aponta também que há dificuldade para alugar esses imóveis, mas no passado a situação foi pior.
No auge da pandemia e do home office, quando os paulistanos procuravam mais espaço para morar e até migraram para o interior, a locação de compactos ficou quase parada. Entre o terceiro trimestre de 2021 e primeiro deste ano, a liquidez caiu 84% em relação a janeiro de 2019.
Mas a partir de abril deste ano, iniciou-se uma recuperação e a relação entre demanda e a oferta de locação fechou setembro com recuo de 70% ante janeiro de 2019. “No momento, já existe uma tendência um pouco mais positiva para locação”, diz Larissa.
A reação pode ser efeito do redirecionamento dos compactos para o aluguel de temporada ou uso pelo próprio do dono.