Brant relembra que essa composição nasceu quando ainda morava na casa dos seus pais, em Belo Horizonte
O ano de 1984 nos reservou grandes clássicos como este.
Muito bem interpretada por Beto Guedes, essa maravilhosa canção de Lô Borges/Fernando Brant, assim como fizeram muitas canções do Clube da Esquina. Lô Borges também a gravou, porém, acabou ficando mais conhecida na voz de Beto Guedes, outro grande compositor. Todos eles são grandes amigos, e fizeram parte do movimento chamado Clube da Esquina, em BH. Flávio Venturini, Milton Nascimento, Lô Borges, Beto Guedes, Fernando Brant (in memorian), todos grandes amigos, grandes compositores e intérpretes, amo todos eles.
Sobre essa parceria feita entre Fernando Brant que compôs a letra, e Lô Borges que fez a melodia. Fernando Brant relembra, segundo ele, que essa composição nasceu quando ainda morava na casa dos seus pais, em Belo Horizonte. Brant faz uso da metalinguagem para falar de si mesmo dentro da canção.
”Da janela lateral do quarto de dormir
Vejo uma igreja, um sinal de glória
Vejo um muro branco e um voo pássaro
Vejo uma grade, um velho sinal”
Brant revela que esses primeiros versos são resultado de sua observação do quarto de sua casa no bairro dos Funcionários em BH. Onde da janela ele vê a igreja de Lourdes, um muro branco, pássaros voando, uma grade (que pode ser da janela) e um velho sinal.
“Mensageiro natural de coisas naturais
Quando eu falava dessas cores mórbidas
Quando eu falava desses homens sórdidos
Quando eu falava deste temporal”
Aqui começa a imaginação, a recordação e a narração metafórica. Brant era repórter da revista “O Cruzeiro”, que lhe propiciou contato com as mais diversas realidades, e se coloca como mensageiro (repórter e letrista) das coisas que acontecem na vida cotidiana. Quando ele expressa: “quando eu falava”, é provável que o autor se referisse a sua atividade como jornalista, como letrista. Ele, como jornalista, é o mensageiro dos diversos acontecimentos que rodeavam sua vida. Cores mórbidas e homens sórdidos podem fazer referência aos militares, governantes e ao contexto político de 1972, quando o Brasil vivia o regime militar que era visto pelo clube da esquina como algo terrível. Ressalta-se, assim, que “temporais” pode fazer referência a situação conflitante ocasionada pela ditadura militar.
“Você não escutou
Você não quer acreditar
mas isto é tão normal
Você não quer acreditar
e eu apenas era”
Através destes versos o autor revela sua preocupação social com a humanidade. Os homens, por estarem tão acostumados à violência, fome e demais atribulações, já cauterizaram sua mente. São indiferentes e despreocupados. Brant, que é mensageiro, já falou e fala, mas não querem acreditar porque ele é um simples mensageiro natural, ao que parece.
“Cavaleiro marginal
lavado em ribeirão
Cavaleiro negro que viveu mistérios
Cavaleiro e senhor de casa e árvores
sem querer descanso nem dominical”
Brant ao falar, mesmo que os homens não escutem, é, segundo ele mesmo, apenas um cavaleiro marginal, ou seja, alguém que vive nessa realidade triste, agonizante, mas não faz parte dela. A palavra “cavaleiro” tem sentido poético, metafórico, e pode significar uma luta para, através das palavras, denunciar as mazelas dessa realidade. “Lavado em ribeirão” denota o banho revigorante do cavaleiro que está em batalha e que não descansa nem aos domingos. Ao se referir a si mesmo como “cavaleiro negro” o autor pode estar fazendo alusão ao fato de ter que compor suas músicas tendo que esconder suas convicções políticas devido à censura do regime militar. Os “mistérios” podem ser as coisas que o autor viveu ao realizar seu trabalho como jornalista, sob a censura do regime militar. pois, sabe-se que durante o regime a atividade jornalística sofreu grande represália e pressão por parte dos militares.
“Cavaleiro marginal
banhado em ribeirão
conheci as torres e os cemitérios
conheci os homens e os seus velórios
quando olhava da janela lateral
do quarto de dormir”
Ele é o cavaleiro que vive dentro dessa realidade de Minas Gerais, mas não faz parte dela, pois se coloca como marginal, está à margem. Revela que participa de fatos desagradáveis, mas que apesar de tudo se banha “no ribeirão”. Neste último verso Brant revela que, através da janela de seu quarto, ele vê as torres, os prédios, — pois o bairro dos funcionários, no qual ele morava, era um bairro em construção e abrigava os funcionários públicos de Minas (…)
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