Porquinhos-da-índia, aves e cães contribuem, e muito, com questões emocionais enfrentadas por pessoas com diferentes diagnósticos
Do portal Metrópoles –
Os benefícios de ter a companhia de um animal de estimação são conhecidos há muitos anos. Eles são capazes de melhorar o psicológico e a qualidade de vida de seus tutores. Mas os animais de assistência emocional vão além disso. Podem ser cães e gatos, pássaros, coelhos, tartarugas, peixes e roedores, como porquinho-da-índia, por exemplo, que ajudam o paciente a encarar algumas situações de estresse.
A psicóloga Gabriella Ciardullo, da clínica Biotipo, explica que esses animais prestam suporte a pacientes com depressão, transtorno de ansiedade e pânico, por exemplo.
“São aqueles que geram um bem-estar, um afago e segurança às pessoas com dificuldades emocionais, psicopatologias, e que fazem bem ao paciente, melhorando consideravelmente o nível do problema de saúde mental”, afirma a especialista.
Meg, uma cachorra da raça Schipperke de 4 anos, e Mel, uma ave calopsita resgatada, foram duas peças-chave no desenvolvimento emocional de Hevelyn Leão, 36 anos, após o diagnóstico de espectro autista, há aproximadamente oito anos.
A moradora de Brasília conta que o diagnóstico já na fase adulta foi muito complicado. “Antes eu tinha muitas crises de depressão por conta do espectro, mas demorou muito para conseguir o meu diagnóstico. Quando tive, passei pela fase de negação até olhar para aquilo e entender que eu precisava aprender a lidar”, conta.
A condição faz com que a carioca, que se mudou para a capital federal aos 4 anos, tenha maior dificuldade para manter relações com outras pessoas. Conversas ao telefone ou chamadas de vídeo são situações que causam grande estresse para ela.
Meg a ajuda diariamente a contornar estas situações e contribuiu para que Hevelyn se sentisse mais independente emocionalmente e menos pressionada a interagir e se relacionar com outros indivíduos.
“As pessoas acreditam que quem tem espectro autista não tem emoção. Eu tenho emoções, mas muitas vezes a gente não consegue expressar isso adequadamente. Eu não conseguia entender algumas questões de afeto, tinha uma dificuldade muito grande”, afirma.
“Eu precisava interagir com as pessoas. A Meg é muito empática, brinca e faz de tudo para que você preste atenção nela. Se percebe que alguma pessoa me olhou e existe a possibilidade de uma interação, ela me força a ir atrás”, continua.
A calopsita Mel, por sua vez, ajudou Hevelyn a ter confiança para organizar a própria rotina, manter o foco nas atividades diárias e a ser mais tolerante com situações que até então eram desconfortáveis, como o barulho de outras pessoas.
“Eu tinha o hábito de acordar ao meio-dia e dormir depois das 4h ou 5h da madrugada porque eu gosto da ausência de barulhos. O barulho em excesso me incomoda. Mas as aves têm uma rotina diferente, elas acordam com o sol e dormem com o sol, e eu precisei me adequar para cuidar dela”, lembra.
Escolha consciente
As características dos animais e as limitações de cada paciente devem ser levadas em consideração para que ambos vivam em harmonia.
Hevelyn conta que demorou aproximadamente um ano para escolher Meg. Ela levou em consideração o tipo de pelagem, a frequência com que o animal deveria ser levado para tosa e a necessidade de gasto de energia diário dele.
“Eu precisava de um animal que fosse facilmente treinado, que se adequasse à minha rotina, e eu, às necessidades dele. Isso tudo porque eu não consigo lidar com acontecimentos repentinos. Eu precisava de animais que fossem um pouco mais independentes, porque se eu tivesse que levar meu animal todo mês para tosa, provavelmente eu não conseguiria fazer isso no meio de uma crise e o meu cachorro ia ficar doente”, explica.
Porquinhos-da-índia
Mudanças externas e inesperadas também podem ser muito difíceis de se lidar por pessoas que enfrentam quadros de depressão e os animais podem contribuir para tornar a adaptação a essas situações mais agradável.
Há aproximadamente um ano, a cientista social e pet chef, Larissa Andrade, 25 anos, abandonou um mestrado devido à depressão, ansiedade desregulada e princípio de síndrome do pânico, e se mudou do Rio de Janeiro para Fortaleza com o marido.
“Foi um momento delicado. Fiquei longe da minha família e senti as diferenças locais. Me vi em um momento em que nada era familiar, a não ser o meu marido e os cachorros”, afirma.
Neste mesmo período, ela perdeu dois de seus cães, Felícia e Frederico. “Eu senti um vazio muito grande dentro de mim, muito complicado de lidar”, lembra.
A chegada dos porquinhos-da-índia Fígaro e Ferdinando, ambos com 1 ano hoje, e o cachorro Freud, 1 ano, deram uma nova luz à carioca, “um refrigério novo”, em suas palavras. Eles se juntaram aos cachorros Alfredo e Fiorella, de 5 e 2 anos.
“Tanto os porquinhos quanto os cachorros são a minha maior razão para continuar viva, para continuar tentando mais um dia, seguir em frente e buscar ajuda para ficar bem de saúde. Eles precisam de mim e eu sou extremamente grata por todo amor e carinho que eles me dão”, conta emocionada.
Apoio no avião
Os pacientes com transtornos psicológicos podem se beneficiar do suporte dos animais não apenas no dia a dia, mas também em todo momento de estresse agudo, segundo a psicóloga.
“Seja numa reunião, em uma palestra ou viagens, situações do dia a dia que desafiam a estabilidade emocional do paciente. E é importante compreender que para cada pessoa, a situação de estresse é diferente. Não podemos julgar a necessidade. Por isso, o caso deve ser avaliado é indicado por um profissional”, afirma Ciardullo.
Em dezembro de 2021, Maria Eduarda, de 8 anos, diagnosticada com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), foi impedida de viajar com a hamster Ivy em voo com conexão de Campinas (SP) para a Bélgica.
Por recomendação de uma psicóloga, a menina tem a hamster como animal de assistência emocional desde junho de 2020. Mas a documentação do animal foi contestada no embarque em Florianópolis (SC).
De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o “transporte de animais não é regulado pela ANAC, exceto o de cão-guia”. Assim, a decisão de ofertar o serviço cabe a cada companhia aérea.