O corte de R$ 988 milhões no orçamento do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) em 2022, sancionado na segunda-feira (24) pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), pode atrasar a concessão de benefícios trabalhistas e previdenciários, como aposentadoria, pensão e auxílio-doença, prejudicar o atendimento dos segurados, levar ao fechamento de agências e, segundo o sindicato de funcionários, aumentar o tamanho da fila de espera, que hoje tem 1,8 milhão de processos.
Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam que o veto agrava a precarização do órgão, que já chegou a ter militares na linha de frente para tentar reduzir a fila, por causa da falta de mão de obra afetam as áreas de administração, gestão e processamento de dados do INSS.
A tesourada deve afetar diretamente a análise de benefícios e o trabalho dos servidores que dependem, por exemplo, dos sistemas de validação de dados. Há também o risco de fechamento de agências por falta de manutenção básica de estrutura, segundo as fontes ouvidas pela reportagem. No total, o Ministério do Trabalho e Previdência, ao qual o INSS está vinculado, perdeu R$ 1,005 bilhão, ou cerca de 41% dos recursos que haviam sido aprovados no Congresso Nacional, deixando o órgão com cerca de R$ 1,4 bilhão para 2022. A pasta é comandada por Onyx Lorenzoni.
“São necessários investimentos em estrutura e pessoal, mas foram exatamente esses os pontos vetados no Orçamento”, diz Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário). O UOL procurou o INSS para pedir um posicionamento sobre as críticas. A resposta será incluída no texto quanto chegar.
Maior tempo de espera e aumento da fila
Bramante afirma que a falta de recursos terá impacto nos processos que estão em análise hoje, que podem ficar mais demorados.
Em fevereiro de 2021, o STF (Supremo Tribunal Federal) fez um acordo para o INSS analisar benefícios em até 90 dias, com o objetivo de zerar a fila de espera.
“Mas tem que haver investimento em pessoal, treinamento e gestão para a fila acabar”, afirma.
Ela diz que o impacto é nos processos que já existem hoje e que o corte não deve aumentar o tamanho da fila. A Fenasps (Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social), porém, discorda.
“Sem possibilidade de manter os empregados terceirizados, vigias e funcionários responsáveis pela higienização, algo tão fundamental nesse momento de pandemia, o serviço provavelmente irá fechar”, diz Viviane Peres, secretária de políticas sociais da entidade. “A demora na realização de perícias médicas e de avaliações sociais e do cumprimento de exigências aumentará a fila da concessão de benefícios.”
Fechamento de agências
Atualmente, o INSS tem cerca de 19 mil funcionários em 1.713 agências espalhadas pelo Brasil, estima a federação, que defende a contratação de mais 20 mil servidores concursados —não há concurso para o órgão desde 2015.
O corte feito por Bolsonaro não diz respeito a previsões de concursos, mas afeta o funcionamento das agências porque pode restringir a contratação de mão de obra terceirizada.
Com a tesourada do presidente, Peres diz que a manutenção das agências do INSS deve ser prejudicada e unidades podem até fechar.
Segundo a Fenasps, hoje já falta até água para servidores e segurados tomarem em algumas agências. Há unidades fechadas por não atenderem os protocolos sanitários contra a covid-19, afirma Peres. Peres defende a contratação de mais funcionários porque a concessão de benefícios como BPC (Benefício de Prestação Continuada) e auxílio-doença depende de avaliação presencial de um técnico, ou seja, não pode ser automatizada.
“É preciso ter investimento e ampliação de atendimento nas agências. Isso possibilita que o segurado que não consegue acessar o Meu INSS, não tem internet ou tem dificuldade em usá-la possa ser atendido presencialmente. Essa população tem buscado intermediários, muitas vezes pagando advogados para conseguir acessar”, declara. “Não somos contra a tecnologia, mas acreditamos no atendimento presencial.”
A Fenasps também critica o presidente do INSS, José Carlos Oliveira, por ainda não ter detalhado quais atividades serão afetadas pelos cortes.
Atendimento virtual também é prejudicado
Bramante destaca que o INSS tem investido mais em tecnologia, principalmente na pandemia, aumentando a oferta de serviços que podem ser acessados via celular e computadores.
Mas ela diz que os sistemas enfrentam instabilidade com frequência e, por isso, é importante investir no aprimoramento dos canais virtuais. “Se a Previdência não estivesse informatizada na pandemia, teríamos um problema catastrófico. Mas nunca é demais investir em tecnologia para melhorar os serviços disponibilizados aos segurados”, afirma.