Arthur Lira, presidente da Câmara, pediu logo após o discurso de abertura do presidente Jair Bolsonaro, que os assuntos eleitorais fiquem somente para o período de campanha
Aqui no Brasil se costuma dizer, em tom de piada, que o ano só começa depois do Carnaval, o que é uma grande injustiça com os anos eleitorais. É bem verdade que, mais uma vez, não teremos Carnaval – pelo menos não em sua data oficial. Na falta deste marco, o Congresso abriu o ano legislativo já em clima de campanha eleitoral no último dia 02, como um prenúncio de que muita água vai passar por baixo dessa ponte.
Teve alfinetada para todo lado. O deputado federal Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, destacou a necessidade de se aprovar as matérias de interesse da população, especialmente por conta da pandemia, e pediu que os assuntos eleitorais fiquem somente para o período de campanha. Sua fala veio logo após o discurso de abertura do presidente Jair Bolsonaro (PL): no geral, um discurso morno, ensaiado, mas com um recado claro para Luís Inácio Lula da Silva (PT-SP), provável concorrente nas urnas. “Os senhores nunca me verão vir aqui neste parlamento pedir pela regulação da mídia e da internet. Eu espero que isso não seja regulamentado por qualquer outro Poder. A nossa liberdade acima de tudo.” Continuou: “sempre respeitaremos a harmonia e a independência entre os Poderes”.
Em outras palavras, o presidente sentou à Mesa Diretora, como manda o protocolo, para defender seu direito de continuar dizendo e espalhando o que bem entender. Nós, aqui na Lupa, já checamos diversas declarações falsas de Bolsonaro, muitas delas repetidas à exaustão. Seu canal no YouTube já teve 34 publicações banidas em 2021, liderando a lista de canais de direita que mais tiveram conteúdo removido no ano passado (e que totalizaram 233 vídeos fora do ar).
A fala de Bolsonaro parece ser um resumo do que podemos esperar dele nas eleições que se avizinham: ora lendo notas muito bem articuladas, ora esbravejando para seu público fiel. No fechamento de seu discurso, quando retomou – com aparente improviso – o tema da “regulação da mídia e da internet”, Bolsonaro adotou o tom de campanha: “Não deixemos que qualquer um de nós, quem quer que seja que esteja no Planalto Central, ouse regular a mídia, não interessa por que, por qual intenção e objetivo. A nossa liberdade, a liberdade de imprensa, garantida em nossa Constituição, não pode ser violada ou arranhada por quem quer que seja nesse país”.
Em um país da dimensão do Brasil, onde um homem negro e pobre é morto a pauladas em um quiosque numa praia no Rio de Janeiro, palavras têm o potencial de matar. Vimos diversos casos ao longo da pandemia, como de pessoas que morreram após fazerem nebulização com cloroquina, procedimento defendido por Bolsonaro. A tática de confundir o eleitor, misturando liberdade de imprensa com uma autorização para dizer o que bem quiser sem se responsabilizar por suas falas tem potencial para seguir matando.
Um sopro de esperança veio na fala do presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que lembrou que a desinformação atrapalhou o combate à pandemia. “Mas a informação prevaleceu no Brasil. Passamos a usar máscaras na nossa rotina, nos isolamos de familiares, amigos e colegas de trabalho, esperamos ansiosos por vacinas que salvariam, e de fato salvaram, vidas brasileiras.”
Aqui na Lupa, nosso ano começou sem Carnaval, mas com a certeza de que estaremos produzindo informação verificada no combate da máquina mortífera da desinformação.
*informação Agência Lupa