Medida sancionada pelo governo pode se transformar em uma espécie de armadilha para a população mais vulnerável
A legislação que autoriza o empréstimo consignado para os beneficiários do Auxílio Brasil, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) em 3 de agosto, pode agravar a situação econômica da população mais vulnerável do país, segundo especialistas. Comprometer parcela tão significativa da renda, no caso dos beneficiários, é um caminho rápido para o superendividamento.
A lei nº 14.431 surgiu de uma medida provisória aprovada pelo Congresso. Ela autoriza uma nova linha de crédito com o objetivo de beneficiar as famílias de baixa renda inscritas no programa do governo. A modalidade prevê desconto direto nas parcelas do auxílio recebido mensalmente.
Foi estabelecido um limite de até 40% para o comprometimento dos ganhos mensais como crédito. Ou seja, quem recebe R$ 600, o mínimo que será pago pelo programa, pode retirar até R$ 240 da renda para o consignado, e sobram R$ 360 para as demais despesas. Os bancos, por outro lado, são livres para definir as taxas de juros.
Bradesco, Itaú, Santander, Nubank e BMG são algumas das instituições que já decidiram não oferecer o crédito. Em reunião na Febraban, na segunda-feira (8/8), o presidente Jair Bolsonaro fez um apelo para que os banqueiros concedam o crédito consignado aos beneficiários do programa de auxílio do governo.
Especialistas avaliam a medida como uma espécie de “armadilha” para a população vulnerável. A nova concessão impulsiona o risco de endividamento, a retroalimentação do sistema financeiro e um potencial aumento nos índices de fraude.
Na visão do economista Paulo Feldmann, da FIA Business School, a nova legislação é “condenável”. Ele sugere ainda que o limite de 40% é extremamente elevado, em especial para famílias em vulnerabilidade social, e chega a ser “cruel”.
Condições básicas de sobrevivência
Ainda no mês de julho, a Defensoria Pública da União (DPU) lançou uma nota técnica alertando para os problemas sociais e econômicos que a promulgação da lei pode causar.
O coordenador do Comitê Temático Especializado Renda Básica Cidadã da DPU, Ed Fuloni, ressalta que a mera possibilidade de financiamento, desvinculada de outras políticas públicas, não altera a situação econômica dos beneficiários, mas implica, a longo prazo, no aumento da pobreza.
O endividamento e a inadimplência atingiram níveis recorde no mês de julho, conforme levantamento divulgado na segunda-feira (8/8), pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Após três meses em queda, o índice voltou a subir no mês passado e atingiu quase 8 em cada 10 famílias brasileiras, maior número registrado nos últimos 12 anos.
A condição extrema, chamada de superendividamento, corresponde à situação em que não é possível para o devedor pagar o que deve sem comprometer o valor mínimo necessário para a própria sobrevivência, conforme definição do Código de Defesa do Consumidor.
*Informações Portal Metrópoles.